A deficiência de vitamina D tem algum papel no desenvolvimento de insuficiência cardíaca crônica? Suplementos auxiliam na sobrevivência?

 

Deficiência de vitamina D no organismo pode ter um papel na patogênese de insuficiência cardíaca crônica, mas oferecer suplementos a pacientes para que eles alcancem níveis normais desta vitamina ainda não está claro.

 

Associação entre deficiência de vitamina D e outras doenças

 

Em meados do século XVII, Whistler e Glisson, independentemente, descreveram o raquitismo como uma doença que causa a deformação grave dos ossos, caracterizada por um atraso no crescimento, deformações na coluna e nas pernas, fraqueza e diminuição do tônus muscular.  Histologicamente, ela é uma doença decorrente da mineralização inadequada do osso em crescimento, ou seja, da placa epifisária. Em 1919, Sir Edward Mellanby identificou a deficiência de vitamina D como a causa do raquitismo.

 

Osteomalacia, outra doença causada pela deficiência de vitamina D, é um problema na mineralização na formação dos ossos em adultos. A vitamina D tem, então, bem conhecidas funções na manutenção da saúde dos ossos e na homeostase do cálcio e do fósforo.

 

Além disso, a deficiência de vitamina D foi recentemente, vinculada a problemas no miocárdio.

 

O complexo metabolismo da vitamina D

 

O metabolismo da vitamina D é complexo e envolve muitos órgãos.

 

Em uma pele exposta à luz do Sol, a protovitamina 7-de-hidrocolesterol é convertida em vitamina D3. A vitamina D3 é também obtida a partir da ingestão de certos alimentos. Entretanto, muitos cientistas consideram a vitamina D mais um hormônio do que uma vitamina clássica, porque a exposição correta ao Sol, diminui a necessidade da ingestão de suplementos alimentares para obtê-la.

 

A forma ativa da vitamina D é sintetizada pela hidroxilação no fígado e nos rins. Pelo sangue, a forma ativa da vitamina D chega a diversos órgãos que classicamente não são considerados alvos principais desta vitamina, como: pele, cérebro, músculos esqueléticos, cardiomiócitos, linfócitos e outras células. Além disso, têm papel importante na regulação celular (função, crescimento e diferenciação de células) em vários órgãos.

 

Muitos pacientes com insuficiência cardíaca têm baixos níveis de vitamina D

 

Nos EUA, mais de 40% dos homens e 50% das mulheres têm baixos níveis de vitamina D (< 30ng/mL) – e baixos níveis em adultos estão associados a doenças das artérias coronarianas e insuficiência cardíaca. Muitos pacientes com insuficiência cardíaca têm baixos níveis da vitamina D, então uma análise para detectar deficiência da vitamina é muito importante em pacientes com insuficiência cardíaca.

 

Em um estudo realizado com mais de três mil pacientes foi medido o nível de vitamina D de cada um. Mesmo após a correção da pesquisa pelos fatores de risco cardíaco, pacientes com menos vitamina D tiveram maior risco de morrer de insuficiência cardíaca ou de morte súbita do que os pacientes com níveis dentro da normalidade.

 

Baixos níveis de vitamina D contribuem para a patogênese da insuficiência cardíaca

 

A vitamina D tem um número de efeitos que devem ajudar a prevenir a hipertensão, um importante fator de risco para a insuficiência cardíaca. Ela protege os rins suprimindo o sistema angiotensina-aldosterona, previne a resistência insulínica e suprime inflamações, o que protege a células vasculares endoteliais.

 

A combinação de excesso de hormônio da paratireoide (PTH) com baixos níveis de vitamina D tem um papel fundamental no desenvolvimento de doenças cardiovasculares por levar à hipertrofia dos cardiomiócitos e à fibrose intersticial do coração. Em estudos em animais descobriu-se que a vitamina D suprime a hipertrofia cardíaca.

 

Atualmente, ainda não está claro se a deficiência de vitamina D é a causa do fator de risco para a insuficiência cardíaca ou é simplesmente reflexo da saúde frágil de um paciente com insuficiência cardíaca que tem pouca exposição à luz solar. Pesquisas já estão sendo realizadas para solucionar esta dúvida.

 

Vitamina D e transplante de coração

 

Pode-se esperar que pacientes em estágios finais de insuficiência de um órgão poderiam estar em alto risco de deficiência de vitamina D pelo limitado acesso à luz do Sol. Entretanto poucos estudos foram realizados para avaliar o papel desta vitamina em pessoas transplantadas de coração.

 

Uma pesquisa avaliou a quantidade de vitamina D imediatamente após a realização de 46 transplantes cardíacos e 23 de fígado. Os níveis foram baixos para ambos os tipos de transplante, mas as taxas nos transplantados de fígado foram muito maiores. Isso pode ser explicado pela baixa absorção e síntese para a formação de vitamina D pelo fígado destes pacientes.

 

Além disso, outro importante ponto é a prevalência de osteoporose em pacientes pós-transplantes de coração, isso parece estar relacionado aos imunossupressivos que estes pacientes recebem. Em tese, aumentar o estoque de vitamina D nos pacientes em período pré-transplante poderia diminuir o nível de perda óssea e osteoporose após um transplante cardíaco.

 

Outras pesquisas são necessárias para determinar se restaurar os níveis adequados de vitamina D na época ou após o transplante previne a rejeição ou aumenta a sobrevivência.

 

Suplementação de vitamina D e a sobrevivência à insuficiência cardíaca

 

As necessidade de vitamina D variam, dependem em parte da exposição ao Sol  e da idade de cada pessoa, de 200 a 600 UI (unidades internacionais) por dia. Atualmente, há especialistas que acreditam que estas medidas estão ultrapassadas e a medida correta deveria ser algo entorno de 1000 UI ao dia. Mais pesquisas ainda são necessárias para esta definição da quantidade ideal de ingestão de vitamina D.

 

O melhor teste laboratorial para determinar os níveis de vitamina D no corpo é o de concentração sérica de 25-hidroxivitamina D3. Um nível entre 20 e 30 ng/mL (50-75nmol/L) é considerado insuficiente, um nível abaixo de 20 ng/mL (50nmol/L) representa a deficiência de vitamina D.

 

A insuficiência de vitamina D é tipicamente tratada com 800 a 1000 UI de vitamina D3 diariamente, enquanto a deficiência requer 50000 UI de vitamina D3 semanalmente entre 6 a 8 semanas, seguido de 800 a 1000 UI diariamente. A meta da terapia é aumentar a quantidade de 25-hidroxivitamina D3 para níveis acima de 30 ng/mL.

 

Atualmente, não se sabe se a suplementação de vitamina D aumenta a sobrevivência em casos de insuficiência cardíaca. É recomendado o teste para verificar se há deficiência de vitamina D em todos os pacientes com insuficiência cardíaca e o tratamento destes da forma indicada acima. Para pacientes com insuficiência cardíaca que não estão com deficiência da vitamina D, a ingestão diária de 800 a 1000 UI é razoável. Novos estudos ainda são necessários para avaliar a suplementação de vitamina D na melhora da sobrevivência de pacientes com insuficiência cardíaca.

 

O artigo destaca:

 

  • Testes laboratoriais para determinar a deficiência de vitamina D em pacientes com insuficiência cardíaca é uma medida correta;
  • Deficiência de vitamina D é comum em pacientes com insuficiência cardíaca e em transplantados de coração;
  • Em tese, atingir os níveis adequados de vitamina D poderia ter um benefício em pacientes com insuficiência cardíaca;
  • Testes ainda são necessários para determinar se a suplementação de vitamina D benefícios em pacientes com insuficiência cardíaca e que têm deficiência desta vitamina.

Tradução revisada de: does vitamin D deficiency play a role in the pathogenesis of cronic heart failure? Do supplements improve survival? Cleveland Clinic Journal of Medicine, Vol. 77, Number 5. May 2010



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